Às vezes fazemos coisas
Que não queremos fazer,
Talvez por existir
Um pingo de esperança
Esperança essa que nem sempre
Nos faz bem
Nos leva para o caminho certo
Às vezes amamos intensamente
Às vezes sonhamos os mais belos sonhos
Às vezes até odiamos
com a mesma intensidade que amamos
Mais o certo é que,
Nem sempre
“Às vezes” dura um só momento
Às vezes os “Às vezes” podem
Durar eternamente!
Nem sempre.
Amor de mis entrañas, viva muerte, en vano espero tu palabra escrita y pienso, con la flor que se marchita, que si vivo sin mí quiero perderte.
El aire es inmortal. La piedra inerte ni conoce la sombra ni la evita. Corazón interior no necesita La miel helada que la luna vierte.
Pero yo te sufrí. Rasgué mis venas, tigre y paloma, sobre tu cintura en duelo de mordiscos y azucenas.
Llena, pues, de palabra mi locura o déjame vivir en mi serena noche dei alma para siempre oscura.
Tradução
O poeta pede a seu amor que escreva-lhe
Amor, que a vida em morte em mim convertes,
espero em vão tua palavra escrita
e, flor a se murchar, meu ser medita
que se vivo sem mim quero perder-te.
É infinito o ar. A pedra inerte
nada sabe da sombra e não a evita.
Íntimo, o coração não necessita
do congelado mel que a lua verte.
Por ti rasguei as veias às dezenas,
tigre e pomba, cobrindo-te a cintura
com luta de mordiscos e açucenas.
Tuas palavras encham-me a loucura
ou deixa-me viver minha serena
e infinda noite da alma, escura, escura.
(Púchkino, Monte Akula, datcha de Rumiántzev, a 27 verstas pela estrada de ferro de Iaroslávl)
A tarde ardia com cem sóis.
em julho deslizava o verão,
fazia calor,
o calor ardia
assim era na datcha.
A colina de Púchkino acorcundava-se
na montanha de Akulov,
E ao pé da montanha –
havia uma aldeia,
encurvada de tetos de cortiça.
E atrás da aldeia
havia um buraco,
e para esse buraco, com certeza,
todo dia, o mesmo ato:
O sol descia – lento e exato.
E no dia seguinte
de novo
a inundar o mundo
erguia-se o sol escarlate.
Dia após dia
isto começou a irritar-me terrivelmente.
E assim uma vez enfureci-me tanto
que tudo desbotou de medo,
à queima-roupa eu gritei ao sol:
– Desce!
Chega de vadiar nessa fornalha!
E grito ao sol:
– Parasita!
Você, aí, a flanar pelos ares,
e eu,
aqui,
cheio de tinta,
com a cara nos cartazes!
E grito ao sol:
– Espere!
Testa de ouro,
que tal deixar os negócios de lado
e vir tomar um chá comigo?
O que eu inventei! Estou perdido!
Para mim, de boa vontade,
ele mesmo,
abrindo seus largos passos-raios
vem à terra.
Quero não mostrar meu susto
e dou uns passos para trás.
Seus olhos já estão no jardim.
Já está atravessando o jardim.
Pelos postigos, pelas portas,
pelas frestas entrando,
a massa do sol desaba,
irrompe;
reconduzindo o fôlego
disse com voz de baixo:
– Pela primeira vez recolho o fogo,
desde que o mundo foi criado.
Você me chamou?
Manda vir o chá,
poeta, manda vir a geleia!
Lágrimas na ponta dos olhos,
o calor me fazia desvairar,
eu lhe mostro o samovar:
– Pois bem, sente-se, astro!
Quem me mandou berrar ao sol,
insolências sem conta?
Contrafeito,
me sento numa ponta do banco
com medo que a coisa fosse piorar.
Mas uma estranha claridade do sol
emanou – e esquecendo
qualquer solenidade, sento a falar
com o astro calmamente.
Disso, daquilo, falo eu,
de como me cansa a Rosta,
e o Sol:
– Bem, não te aflijas,
olha para as coisas simplesmente!
E eu? Você pensa que brilhar é fácil?
Vamos, experimenta!
Mas quando se começa é preciso prosseguir
e a gente vai e brilha pra valer!
E o sol, por fim:
– Vamos, poeta,
vamos raiar, vamos cantar
no mundo de trastes cinzentos.
Eu, Sol, verterei o que é meu,
e tu, o que é teu, os versos.
Conversamos até a noite ou até o que,
antes,
eram trevas.
Como falar, ali,
de sombras?
Ficamos íntimos, os dois.
Logo, com desassombro,
estou batendo no seu ombro.
O muro das sombras,
prisão das trevas,
desaba sob o obus
dos nossos sóis de duas bocas.
Confusão de poesia e luz,
chamas por toda a parte.
Se o sol se cansa
e a noite lenta
quer ir pra cama,
marmota sonolenta,
eu, de repente,
inflamo a minha flama
e o dia brilha novamente.
Brilhar para sempre,
brilhar como um farol,
brilhar com brilho eterno,
gente é pra brilhar,
que tudo mais vá para o inferno,
este é o meu slogan – e o do Sol!
(Vladimir Maiakovski – 1920)
Notas:
Datcha – casa de veraneio.
Versta – medida itinerária equivalente a 1,067m.
Rosta – A Agência Telegráfica Russa, para a qual Maiakovski executou cartazes satíricos de notícias – as “janelas” Rosta -, de 1919 a 1922.
Morrer sem deixar o triste despojo da carne,
A exangue máscara de cera,
Cercada de flores,
Que apodrecerão – felizes! – num dia,
Banhada de lágrimas
Nascidas menos da saudade do que do espanto da morte.
Morrer sem deixar porventura uma alma errante…
A caminho do céu?
Mas que céu pode satisfazer teu sonho de céu?
Morrer sem deixar um sulco, um risco, uma sombra,
A lembrança de uma sombra
Em nenhum coração, em nenhum pensamento,
Em nenhuma epiderme.
Morrer tão completamente
Que um dia ao lerem o teu nome num papel
Perguntem: “Quem foi?…”
Morrer mais completamente ainda,
– Sem deixar sequer esse nome.
Ó Capitão! Meu Capitão! Finda é a temível jornada,
Vencida cada tormenta, a busca foi laureada.
O porto é ali, os sinos ouvi, exulta o povo inteiro,
Com o olhar na quilha estanque do vaso ousado e austero.
Mas ó coração, coração!
O sangue mancha o navio,
No convés, meu Capitão
Vai caído, morto e frio.
Ó Capitão! meu Capitão! Ergue-te ao dobre dos sinos;
Por ti se agita o pendão e os clarins tocam teus hinos.
Por ti buquês, guirlandas… Multidões as praias lotam,
Teu nome é o que elas clamam; para ti os olhos voltam,
Capitão, querido pai,
Dormes no braço macio…
É meu sonho que ao convés
Vais caído, morto e frio.
Ah! meu Capitão não fala, foi do lábio o sopro expulso,
Meu calor meu pai não sente, já não tem vontade ou pulso.
Da nau ancorada e ilesa, a jornada é concluída.
E lá vem ela em triunfo da viagem antes temida.
Povo, exulta! Sino, dobra!
Mas meu passo é tão sombrio…
No convés meu Capitão
Vai caído, morto e frio.
Já não me diz nada um por do sol em Cancun
e um coqueiro em alto-mar já vagou por protetores
de tela demais para me causar qualquer sensação
de bem-estar; os casais parisienses que habitam
calendários já não me dão sequer vontade
de ir a Paris assim como não me comovem
mais as crianças de Sebastião Salgado, nem
a menina que foge do ataque do napalm
e que em breve estampará cangas e biquínis;
as imagens estão gastas e não há nenhuma
que erga pontes como a palavra que.
A escuridão tomava o lugar, o cheiro de merda e enxofre entorpecia minha mente. Ouvi o barulho da ninhada de ratos e senti alguém me espreitando. Estava vendado com o rosto inchado por uma turba de monstros. Naquela noite senti um cheiro diferente, uma excrescência nauseante, um cheiro pútrido agridoce que ninguém mais notava.
Senti a faca talhar um pequeno corte diagonal feito com precisão cirúrgica perpassando a derme, os músculos e arranhar o forame do processo xifóide. Ouvi depois o barulho de corrente. Era a vez do gancho. O mesmo foi engatado no corte e fui içado com força. O sangue verteu e lambeu o solo. Ainda assim, neguei-me a responder qualquer pergunta. E a noite continuou a cortar e esfolar. A ninhada de ratos se satisfez devorando as partes arrancadas. A turba não voltaria àquele galpão. Sobrou apenas meu algoz. Concentrei-me para ouvir o chamado. A floresta me clama. O chamado selvagem.
O algoz percebeu os grilhões sendo rompidos. Pegou o gancho e espreitou a escuridão, percebendo que a escuridão espreitou de volta. Agora ele era a presa. Eu era o monstro que estava liberto e furioso. Era um monstro diferente. Ele moveu-se vagarosamente em direção ao portão. Sentia os olhos seguindo seu movimento e o calor da respiração. Perguntou-se porque estava com medo já que suas glândulas estavam mortas há muitos anos. Parou de simular humanidade, não havia vantagem nenhuma em fingir ser um humano. Sentiu ou pensou sentir ânsia de vomito que em ser humano causava-lhe, repugnante, vermes precisando de reis e políticos para guiá-los para além da latrina fétida do qual nasceram. Era a personificação das sombras, então se fundiu a escuridão e preparou as presas…
É a noite que os espíritos são libertos, espectros do caos e da desordem. À noite escapam os traficantes, pedófilos, estupradores e toda escoria da sociedade. Um ambiente propício para sanguessugas, parasitas que vivem da escoria do que chamamos sociedade humana. Esses parasitas estão bem organizados, estão nas mais diferentes áreas do poder, espalhando corrupção, alastrando maldade, corrompendo mentes com livros e filmes fast-food – divertidos, mas nada nutritivos. É na noite que eles se proliferam, as metáfora de sombras que se afastam da luz, a antítese da vida e do devir.
Mas eu sou o caçador e o lobo, sou o chamado selvagem, a força da vida em seu estado mais bruto. Não existirá nada que não possa farejar; nada que possa me fazer recuar, nenhum ômega pode me parar, sou o alfa. Sou o começo que chega após o fim. Então, verme imundo, saiba que a lua sempre está cheia, mesmo que algumas vezes só possamos ver parte dela, mas pode-se escutar seu chamado, o seu chamado selvagem…